A Constituição Dogmática Dei Verbum do Concílio Vaticano II, recomenda vivamente a leitura assídua da Sagrada Escritura. Exorta todos os fiéis cristãos, religiosos e consagrados a esta frequente leitura (DV, 25). Como seria possível viver sem o conhecimento das Escrituras, se é por elas que se aprende a conhecer o próprio Cristo? Se, de um lado, a Bíblia nos ajuda a conhecer mais a figura e a pessoa de Cristo, de outro, ela ajuda a entender e aprofundar aquilo que vivemos em Cristo, isto é, a decifrar o sentido de nossa vida cristã. Por isso, a leitura orante da Palavra de Deus, também chamada de sentido espiritual, nos ajuda a descobrir como a Palavra de Deus, dita em linguagem humana, continua a nos falar no hoje de nossas vidas. Aqui reside a inesgotável riqueza e atualidade da Palavra de Deus.
A cada leitura atenta da Bíblia, percebemos a inesgotável riqueza da Palavra de Deus. O povo cristão procura e encontra na Bíblia “o conhecimento de Deus e do homem e o jeito pelo qual o justo e misericordioso Deus trata com os homens” (DV, 15). Podemos dizer que ela é a revelação da graça e da misericórdia de Deus (DV, 2).
A importância e significado primeiro da Bíblia está no fato de Deus se revelar, isto é, de se dar a conhecer no diálogo que estabelece conosco. Ele nos fala como a amigos e nos convida para a comunhão com Ele. Mas não podemos nos esquecer que uma autêntica leitura da Bíblia deve ser sempre acompanhada pela oração, a fim de que se estabeleça o já mencionado colóquio entre Deus e nós. Neste sentido, é que vemos crescer cada vez mais entre os fiéis, a leitura orante da Bíblia. No silêncio e na oração, ouvimos Deus que nos fala. Assim, o mesmo Espírito que falou por meio dos Profetas, sustenta e inspira a Igreja no dever de anunciar esta mesma palavra acolhida e meditada. O testemunho e o anúncio da Palavra de Deus são a melhor forma de o homem responder à iniciativa de Deus que vem ao seu encontro e dialoga através de suas palavras (VD, 24).
Neste ano Conferência dos Bispos do Brasil, através da comissão episcopal para a animação bíblico-catequética, nos propõe a leitura do livro de Josué, cujo lema é: “O Senhor teu Deus estará contigo por onde quer que vás” (Js 1, 9). A mensagem teológica do referido livro está pautada na observância da Lei de Deus. Ela não deve ser só contemplada, mas praticada, testemunhada e ensinada. Toda garantia de sucesso histórico de Israel dependerá do seguimento à Lei e caminhar em conformidade a vontade de Deus. “Sede, pois, fortes e cuidai de pôr em prática tudo o que está escrito no livro da Lei de Moisés, sem vos desviardes nem para a direita nem para a esquerda” (Js 23, 6).
Seguir a Lei traz felicidade e boa convivência familiar e social. As normas decorrentes da Lei geram experiências na defesa dos direitos da família, da não violência praticada às viúvas, aos órfãos e aos estrangeiros. Sobressai aqui a primazia da pessoa sobre qualquer realidade material, pois Deus não faz acepção de pessoas, mas faz justiça ao órfão e a viúva, ama o migrante e lhe dá alimento e roupa. A observância da Lei indica fidelidade ao Deus único. A narrativa de Josué é um forte apelo à pertença e à fidelidade a Deus; assim como um convite a sermos praticantes da Lei (Texto-Base, p. 21). A obediência à Lei é o fator primordial desse livro.
Numa época de urgente cuidado e abertura ao outro, onde muita gente procura por terra, casa e trabalho, a leitura e medição desse livro poderão auxiliar na superação do indiferentismo, indispensável aos membros do Povo de Deus e para um autêntico anúncio da Palavra, pois ela se torna eficaz quando traduzida no amor e no serviço ao próximo, sobretudo aos mais vulneráveis. Amar o próximo é, num só tempo, aprova de que temos fé e o resumo de toda moral (Gl 5, 6-7). “Deus que não é indiferente, intervém na história a favor do homem e da sua salvação integral” ( Verbum Domini, 23).
Que o lançamento da semente da Palavra de Deus encontre terrenos férteis, afim de fecundar o coração de todos, favorecendo o surgimento de uma humanidade renovada, aberta a Deus e aos irmãos.
† Dom Pedro Cunha Cruz
Bispo Diocesano Da Campanha – MG